domingo, 24 de abril de 2011

1º Concurso de Contos - Dragões de Éter

ENCONTRO

Quando ela o avistou de longe pensou que iria desmaiar. Sentiu todo o corpo gelar e seu coração batia a uma intensidade que dificultava a respiração. Perdeu a noção do que acontecia ao redor, naquele momento seu mundo se concentrava nele.
Foi levada de volta à realidade apenas quando Ariane Narin agarrou seu braço. Ouviu a amiga dizer algo, mas não conseguiu entender o quê, parecia que tudo girava e ela queria sumir, não queria ser notada por ele, isso apenas traria à tona toda a dor contra a qual lutara por três anos e ainda não conseguira suprimir totalmente. Por sorte, sua amiga a conhecia bem e a retirou do meio da multidão que o rodeava.
- Tudo bem? – disse Ariane preocupada com a amiga.
- Não sei. Quero ficar sozinha – na realidade queria deixar de existir. Não sabia ao certo o que sentia, mas doía muito. Tentava não pensar para não se lembrar de todos aqueles momentos tão difíceis que visitavam seus sonhos todas as noites. Teve medo de encontrá-lo de novo, de sofrer novamente.  

***

Quando ele a avistou de longe sentiu o coração disparar. Sabia que não deveria sentir aquilo, mas também sabia que era natural senti-lo. Afinal, ela já fizera parte da sua vida e representava o que ele fora um dia.
Sim, a apreensão era inevitável, era como ver o passado em sua frente, com todas as dores e alegrias. Era natural que seu coração disparasse, afinal, ela estava linda. Era uma beleza diferente da qual ele havia se acostumado nos últimos três anos, era a beleza dela, que não seria encontrada em nenhum outro lugar.
Pensou em ir até ela, mas falar o quê? Havia tanto para se falar, mas como ser dito?
Não. Ir até lá só iria mexer em feridas já cicatrizadas, ou quase. Só traria mais sofrimento para aquela menina por quem ele tinha um carinho tão especial.
Queria ir até ela, encontrá-la novamente, pedir desculpas talvez. Mas teve medo de magoá-la de novo, de que ela não compreendesse, teve medo de encará-la. Os dois deveriam ter mudado muito em três anos, temia que ela não fosse mais aquela menina que um dia conhecera...
Não. Ir até lá só iria machucá-la mais. Ele tinha seu dever e ela teria que compreender isso. Às vezes nossas vidas tomam rumos inesperados.
Decidiu ir até ela, perguntaria se estava bem, se precisava de algo. Ouviria sua voz novamente, olharia em seus olhos...
Não. Tudo havia mudado, três anos fora tempo demais e ver o rapaz que se aproximava dela o fez ter certeza disso. Já o havia visto antes, era algum nobre, seu rosto não era estranho.
Observou os dois. Ela mantinha um ar discreto, como sempre, mas o jeito exibido do nobre por algum motivo o irritou. De repente se lembrou porque preferia tanto os plebeus. Sentiu a irritação aumentar quando viu o rapaz afastar os cabelos dela, aproveitando para acariciar-lhe o rosto. Ela tentou esquivar, mas ele insistiu e aproximou-se ainda mais.
Fechou os punhos, sentiu o coração pulsar na garganta. Estranho, há anos não sentia aquela sensação. Não, ela era boa demais para ele.
Começou a ir até ela, o coração batendo forte, os punhos ainda fechados...
Parou. Observou outro rapaz se aproximar. Dele recordava-se de algumas festas no Grande Paço... Casanova. Lembrava-se também de sua fama com as garotas.
Observou de longe. Casanova se aproximou dos dois, encarou o outro rapaz, depois se dirigiu a ela e, ao cumprimentá-la, a envolveu com os braços pela cintura. Seu coração disparou novamente, sentiu a raiva o dominar, notou que não conseguia respirar direito. Percebeu que ela ficara envergonhada e tentava desvencilhar-se dos dois, mas eles a cercavam.
Então compreendeu que os dois se provocavam e que o objeto de provocação era ela. Ao perceber isso sua raiva aumentou. Pelos últimos três anos seu maior medo foi que ela se envolvesse com alguém que não a amasse e que pudesse fazê-la sofrer. E aqueles dois que a disputavam definitivamente não a mereciam.
Rogou ao Criador que a tirasse dali, sentiu que não conseguiria mais se conter.
Começou a caminhar até ela, então viu que sua prece fora atendida. Ela despediu-se dos dois e partiu, deixando-os sozinhos, encarando-se com sorrisos de provocação.
Então se acalmou e se sentiu um tolo. Não deveria sentir aquilo, não podia. Tinham vidas totalmente diferentes agora e ela não era mais sua responsabilidade. Precisava acostumar-se com isso, por isso teve certeza – não podia vê-la novamente.

***

Quando eles se encontraram, três anos depois da última vez, estavam mais perto do que esperavam. Estavam a menos de dois passos. No entanto parecia que um abismo os separava.
Era como se os semideuses houvessem tramado aquele encontro, pois apesar de terem se evitado por dias acabaram encontrando-se em um lugar muito peculiar – em frente à Catedral da Sagrada Criação. Quando se deram conta estavam frente a frente e não sabiam o que fazer.
Seus corações batiam forte, ela estava corada, sentia a perna fraquejar e um nó apertar-lhe a garganta, mas tentava agir naturalmente, bem, ao menos tentava.
Ele estava nervoso, sentia um ardor na boca do estômago e não sabia o que fazer, então arriscou:
- Olá Maria Hanson.
O coração dela vacilou por um momento. Há tanto tempo não ouvia aquela voz. Seus olhos encheram de lágrimas, mas conseguiu contê-las. Então respondeu ao cumprimento do príncipe com toda sua segurança e cordialidade.
- Boa tarde, Vossa Alteza.
Ele a observou por um instante, parecia triste. Notou que ela não o olhava nos olhos.
- Tudo bem?
- Tudo ótimo – ela disse, e começou a andar deixando-o para trás – Com licença.
Ele a segurou pelo braço e não conseguiu conter as palavras.
- Espere, por favor.
Quando ela sentiu seu toque foi como se todo o passado retornasse, seu coração deu um salto e os olhos encheram-se de lágrimas. Não queria encará-lo, mas algo a impedia de partir.
- Senti saudades.
A voz dele foi tão sincera que ela não resistiu e se virou. Fitaram-se por um longo momento. Foi como se pudessem se compreender totalmente sem nem dizer nada, como se os últimos três anos não tivessem sido nada além de um sonho ruim. Dariam qualquer coisa para ficar ali simplesmente se olhando.
Então, por um impulso se abraçaram.
E lágrimas falaram mais do que as palavras.
E toda a dor, toda e qualquer mágoa foi substituída pelo carinho e amor que sentiam um pelo outro.
- Me desculpe. – Axel não sabia por onde começar – Nunca quis fazê-la sofrer.
- Eu sei. – Maria sentia-se tão segura nos braços dele, não queria que ele a soltasse.
- Me desculpe, Maria, sei que não foi certo o que fiz. Não deveria ter me envolvido com você sabendo do meu compromisso, mas quando a conheci eu era diferente, era irresponsável e não pretendia honrar um compromisso firmado por meu pai.
Maria não conseguia responder, apenas chorava.
- Mas você me transformou. Não me importo com meu desejo ou dor, mas me martiriza todos os dias ter feito você sofrer. Durante esses três anos sonhei com seu perdão.
- Ainda que sofresse minha vida inteira, Axel Branford, teria valido a pena passar ao menos um dia ao seu lado.
Axel a abraçou o mais forte que pôde. Queria aquela menina para sempre em seus braços. Seus corações batiam tão intensamente que um conseguia sentir os batimentos do outro.
Como se fossem um.
- Gostaria de poder ficar.
Um nó apertou a garganta de Maria.
- Quando você parte? – lágrimas voltaram aos seus olhos.
- Amanhã.
- Entendo. Sua esposa o espera.
Axel levantou o rosto de Maria e a olhou nos olhos.
- Ela é muito especial, mas gostaria que você estivesse comigo.
Maria franziu o cenho.
- Isso não importa mais. Você é casado agora e é melhor voltar logo para sua esposa.
Maria se desvencilhou do abraço do príncipe e o encarou com tristeza.
- Você é muito especial, Maria. Gostaria de fazê-la feliz, mas ainda não posso. Espero que encontre alguém que te mereça.     
- Não sei se quero.
- Vai querer. Mas, por favor, não caia na conversa daqueles dois que estavam com você outro dia, você é boa demais para eles.
Maria sorriu.
- Juan e Giacomo são apenas amigos. Já disse isso a eles, mas acho que gostam dessa competição.
Axel sorriu.
- É, subestimei sua inteligência.
Os dois sorriram sinceramente. Gostavam de estar juntos.
- Tenho que ir. – O sol começava a se pôr.
A tristeza voltou a tomar-lhes a face.
- Espero que seja muito feliz.
- Nunca se esqueça, Maria Hanson, não importa onde ou com quem eu esteja, sempre te amarei e estarei pensando em você.
Lágrimas brotaram novamente dos olhos de Maria. Axel a abraçou forte, enxugou suas lágrimas, deu um beijo em sua testa e partiu... Novamente...

Também sempre te amarei Axel Branford...

De repente Maria abriu os olhos e viu a janela do seu quarto. Sentiu o travesseiro úmido e percebeu que chorara enquanto dormia. Só então entendeu que tudo fora um sonho.
Mais um sonho.
Mas aquele pareceu ser tão real...
A dor apertou seu peito. Todas as vezes que sonhava com ele sentia-se assim, mas na verdade gostava de sonhar, dessa forma sentia-se mais próxima dele e conseguia forças para continuar. Apenas não gostava de alimentar esperanças de voltar a encontrá-lo.

***

Livith acordou pela madrugada e viu que Axel não estava na cama, então foi procurar o companheiro. Viu que estava sentado na relva olhando para o céu com uma expressão triste e um olhar distante.
Aproximou-se e o abraçou. Sabia que aquele não era seu lugar. Adaptara-se muito bem ao Nunca, mas ainda não seria naquele momento que o chamaria de lar.
Sabia que seu coração estava muito distante dali, em Arzallum.
E sabia também que seu lugar é onde habita o seu coração.
Aquele definitivamente não era o lugar de Axel e perceber a angústia do companheiro a deixava infeliz.
Axel ainda olhava para o céu como se esperasse algo acontecer.

E lá no alto a estrela de Blake iluminava o céu escuro.


Um comentário:

  1. É tão lindo isso, pena que eles nunca poderam ficar juntos de novo. Eu sinto tanta pena.

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