quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa (27/11/1930)

PESSOA, Fernando. O eu profundo e os outros eus: seleçãopoética;seleção e nota editorial de Afrânio Coutinho. 20ª ed. Rio de Janeiro, N. Fronteira, s/d.

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